A mãe e os dois filhos, não das figuras que suscitam mais contemplação nos areais (à excepção de algum voyeurismo desviante), deitados a queimar, dormidos, dormentes quiçá, o bronze faz as pessoas mais bonitas, dizem. A aparência é tudo. Um dos rapazolas, seguindo as pegadas dos progenitores, com umas boas dez dezenas de Quilogramas das quais uma percentagem não inferior a 30% estaria claramente em excesso, ferrado, vermelho como o pimentão de horta, famosíssimo e inigualável tempero alentejano.
O outro petiz, com alguns dentes que não viam pasta dentífrica há, correcção, que nunca devem ter visto pasta dentífrica, também contemplativo, sonhador, sobre a toalha. Cabelos grandes, oleosos, num resquício qualquer de um grunge definhante com um puchinho a apanhá-los.
Por fim, a mãe. Orca. Grande. Parecia ter sido apanhada pelo acaso numa qualquer traineira e abandonada à sua sorte tendo dado à costa e, se efectivamente uma, teria honras nas notícias das oito. Orca deu à costa alentejana . Biólogo tenta descobrir razão do desnorte do animal. Provavelmente terá sido ferida por uma rede piscatória dedicada às sardinhas. Incorrigível. Inenarrável.
Posto isto, o volte-face.
O senhor ultra-bonacheirão levanta-se e observa companheira e filhos. Pára. Dois passos, uma observação atenta e cuidada com e sem óculos. Contemplação. Uma espreguiçadela e lá vai ele. Saco de praia da esposa, com estrelas do mar e peixinhos amarelos, saca do protector solar. Piz Buin factor 40. O que se segue foi, asseguro-vos, da maior ternura que já vi nas praias nacionais. Aliás, no território nacional. Vindo dos mais improváveis personagens.
Um a um, borrifou-os a todos com a protectora substância. Com cuidado, dedicação, devoção, a minha pele arrepiou-se, garanto. Os filhos, deitados na sonolência profunda nem pelo pulverizador deram. Mas este, o senhor mais velho, o pai, enquanto borrifava a mulher não se borrifava nela. E isto foi tudo.
Cabelo para o lado, borrifa as costas. Sobe o fecho do soutien, terno, delicioso. Psscchhht, psscchhhht. Baixa mais um pouco, chega ao fondoschiena. E agora? Terror, receio, temor. Viro-me para o lado e leio o jornal? Não, já agora deixa-me lá ficar mais um pouco, que se dane, não há-de ser assim tão terrível.
Nada, simplesmente nada. O acto mais singelamente belo que assisti num passado recente. Carinhosamente, o senhor baixa um pouco, ma non troppo, as cuequinhas (tamanho XXXL, possivelmente) da senhora, dobra-as para dentro, borrifa-a, volta a subir, cuidadosamente, e só no final, depois da família tratada com a segurança que um sol forte exige, toma ele próprio as devidas precauções.
Belo.
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